terça-feira, 8 de dezembro de 2009

A mensagem

Já fumou mais de um maço de cigarros. Fez e desfez aquela mensagem no telemóvel mais de uma centena de vezes. Começou a escreve-la durante a tarde e já passa das duas da manhã e ainda não conseguiu enviá-la. Mudou algumas palavras, trocou o sentido a alguns pensamentos, abreviou termos.

Não consegue dormir. Enquanto deixa o tempo passar já correu todos os canais da televisão, já devorou um livro, já tentou escrever no computador, já fumou, já se deitou na cama, já se levantou, já se deitou mais uma vez, já olhou o telemóvel milhares de vezes, já esta e escrever outra vez.

Escolhe umas músicas no computador, senta-se e olha para as frases no ecrã. Não sabe qual a hora certa para enviar a maldita mensagem. Talvez agora ou mais tarde ou nunca. Acende mais um cigarro. Tem tantos pensamentos a fervilharem na cabeça que não consegue ordena-los nem transcreve-los. As mãos querem escrever mas o cérebro não está em posição de as comandar.

Atira a cabeça para trás e retira as mãos do teclado. Ouve a música e fuma. Ele não vai responder mas ela tem que lhe dar um sinal de vida. Dizer que ainda está algures por aí mas que não sabe se ele ainda está. Mas serão aquelas as palavras certas? Será que ele vai conseguir retirar o sentido certo que tentou dar a cada palavra, a cada frase, a cada pensamento? O tempo passa e o telemóvel continua ali a sua frente como um carrasco sem máscara.

Olha para a hora. Já olhou tanta vez que ainda não percebeu se está a passar veloz ou preguiçosa. Voltou cedo do café. Deu algumas voltas de carro pela cidade. Talvez tenha vindo cedo de mais para casa. Agora tenta inventar coisas para chamar o sono. Ontem bebeu demais, dormiu de menos. Está cansada mas o sono não vem.

Enviou a mensagem. Hesitou mas conseguiu. O dedo tremeu e o coração também. De repente consegue voltar a sua atenção para o teclado, para o ecrã. As ideias começam a fluir ordenadas. Mas parece que lhe falta o ar. Sente o peito apertado. Apetece-lhe outro cigarro. As pernas vacilam quando se levanta para tirar o maço de cigarros da carteira.

Agora só lhe resta esperar. Sabe que ele está a dormir. Melhor assim. Vai acordar com as suas palavras. Não importa que não responda. Tem a certeza que vai ler aquela mensagem até ao fim e isso basta-lhe. Mas o medo persiste. Medo de cair no ridículo. Medo que a verdade e os sentimentos a façam cair no ridículo. Mas ridículo talvez seja guardar tudo dentro de si, deixar passar ao lado a vida, não deixar transpirar a sua vontade.

Desliga o computador. Fecha a janela. Deita-se na cama desfeita. Lê a mensagem mais uma vez antes de dormir.

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