quarta-feira, 11 de novembro de 2009

A Varanda

Lá está ele na varanda. Eu estou na varanda. Todos os dias nos encontramos ali à mesma hora. Fumo o meu cigarro. Está frio. Às vezes ele dirige-me o olhar. Não trocamos uma palavra. Às vezes estaciono o meu carro junto ao dele, na esperança de que ele faça um arranhão no meu carro. Está mesmo frio. Não posso ir para dentro. Não consigo. Estou hipnotizada. Às vezes imagino que ele vem à varanda para me ver. Parvoíce.

E aqui estamos os dois separados por uma estrada. Varandas frente a frente.
Gosto de varandas. Comprei a casa por culpa da imensa varanda que a rodeia. A casa nem é grande coisa. Tem rachas nas paredes. Precisa de obras. Os quartos são pequenos e a cozinha está ultrapassada. O quarto de banho tem uns azulejos medonhos. Mas foi a varanda que me chamou a atenção. Tinha que comprar esta casa. As varandas dão-me uma sensação de liberdade. Saio das quatro paredes da casa e fujo para lá, onde posso respirar. Há uma zona da varanda de onde consigo ver o mar. Um risco de mar. Será que ele também vê o mar?

Pega no telemóvel. Está sempre ao telemóvel. Eu estou sempre a fumar. Já tentei deixar de fumar. Mas o cigarro faz-me companhia. Daqui a pouco volto para dentro. Ainda não, ainda é cedo. Ele continua ao telefone. Não me vê.
Às vezes encontro-o num café qualquer ou até mesmo no supermercado. Não nos cumprimentamos. Está sempre sozinho. Continua ao telemóvel. Deixa-me nervosa com tanto telefonema. Desliga. Agora vira-se de costas. Toca o meu telemóvel. Vou a correr para a sala. Quando volto a varanda ele já não está lá.

Saio da varanda. Verifico se está tudo bem em casa. Pego nas chaves. Não, o telemóvel fica em casa. Fecho a porta. Desço as escadas devagar. Não quero parecer muito apressada. Atravesso a estrada. Toco a campainha que conheço de cor. A porta abre. Não acendo as luzes. O elevador nunca mais desce. Quando chego a porta já está aberta. Só uma fresta como sempre. Abro devagar e entro.
- Então, tudo bem? Acho que já está na hora de deixares de fumar.
- Sim. Talvez. Pensei que nunca mais desligavas aquela chamada.

1 comentário:

  1. Aprecio a concorrência, agora é criar.
    Gostei, é estranho o texto, o final não é nada previsivél, mas explica tudo

    Bjs

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